VARIAÇÃO GENÉTICA, METABOLISMO E COMPOSIÇÃO CORPORAL (DUDU)

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Existe uma grande variação na população na forma em que as pessoas respondem à dieta, para o ganho ou perda de peso, e melhor dizendo, para o ganho e/ou perda de gordura corporal. O entendimento da importância e da influência variável de fatores genéticos e ambientais é importante para qualquer pessoa que estude o metabolismo, pois ao tratar diferentes indivíduos o peso desses fatores para cada indivíduo pode ser muito variável, e diferentes estratégias de intervenção nutricional, farmacológica e de treinamento devem ser pensadas para cada caso. Embora muitos acreditem que “uma caloria é uma caloria”, alguns estudos mostram que nem todos os indivíduos ganham a mesma quantidade de peso quando expostos a dietas hipercalóricas [1, 2].

Como disse em um texto anterior a eficiência dos processos metabólicos pode ser diferenciada dependendo da dieta escolhida e dependendo do metabolismo do indivíduo. Na física a resposta para isso é dada pela segunda lei da termodinâmica. Essa lei determina que existe uma ineficiência metabólica inevitável em todos os processos biológicos e bioquímicos com calor e moléculas de elevada entropia (dióxido de carbono, água, ureia) como os produtos mais comuns [3]. Dessa forma, o perfil genético de um indivíduo é determinante na forma em que ele responde aos fatores ambientais, produzindo eficiência metabólica variável entre vários indivíduos em uma população, e isso pode se traduzir em diferentes respostas à insulina e leptina (regulação do peso e apetite diferenciada), diferenças na taxa metabólica, diferentes taxas de oxidação de gorduras etc [4].

Apesar da sequência de DNA nuclear entre dois indivíduos de uma mesma espécie ser muito semelhante, chegando à quase 99,9% de similaridade, é justamente a pequena fração restante do DNA que é responsável pela variabilidade geneticamente determinada entre dois indivíduos, o que nos torna diferentes uns dos outros [5]. Entre as várias formas de variação genética entre indivíduos, muitas delas estão associadas à diferenças no metabolismo entre os indivíduos, e como foi dito acima e nos interessa discutir aqui, diferentes respostas metabólicas associadas ao ganho e/ou perda de gordura. Frequentemente a variação genética do DNA é também chamada de “polimorfismo”. Polimorfismos são variações genéticas que podem ou não refletir em uma alteração fenotípica (caracteres observáveis do indivíduo: cor dos olhos, cabelo, aparência física etc) [5].



Um gene é um segmento de DNA que contém a informação para síntese de uma determinada proteína, e são as proteínas, na forma de enzimas, receptores, hormônios (insulina, GH, IGF-1 etc), proteínas transportadoras, que vão regular nosso metabolismo. A ação do DNA, ou expressão gênica, está diretamente relacionada à síntese de proteínas, e indivíduos com perfis genéticos diferenciados expressarão esses genes de forma também diferenciada, provocando diferentes respostas metabólicas (hormonais, enzimáticas), o que fará com que a perda e/ou ganho de gordura possa ter uma grande variação entre diferentes indivíduos.

A obesidade é considerada uma doença poligênica, o que significa que vários genes estão envolvidos na determinação do fenótipo da obesidade, genes que podem estar associados à sensibilidade à insulina, como o gene que codifica a adiponectina (ADIPOQ), uma molécula secretada pelo tecido adiposo e que está reduzida em indivíduos obesos, mais resistentes à insulina. Variantes desse gene são associadas a maior resistência à insulina, diabetes tipo 2 e outras características da síndrome metabólica. Existem outros genes associado à sensibilidade à insulina, como PPARG. Existem variantes genéticas de genes associados à lipólise, como os genes que codificam os receptores beta-adrenérgicos do tipo beta-2 (ADRB2) e beta-3 (ADRB3). Polimorfismos desses genes estão associados à resistência na perda de peso e aumento do IMC e da circunferência da cintura. Ainda existem outros genes relacionados à regulação do apetite (como LEPR), genes relacionados ao gasto energético (relacionados à proteínas desacopladoras mitocondriais: UCP1, UCP2 e UCP3), genes relacionados ao metabolismo de lipídeos (como FABP2 e PLIN1) [5].

Longe de querer dar uma resposta pronta ou sugerir alguma estratégia mágica para perda de gordura, a intenção desse texto é mostrar que o metabolismo diferenciado das pessoas está associado à perfis genéticos diferenciados, e uma estratégia que visa mudar o físico de uma pessoa, seja um obeso, ou um indivíduo comum que deseje uma melhora de composição corporal, precisa considerar essa variabilidade de respostas. Estudos recentes têm mostrado por exemplo que indivíduos mais resistentes à insulina respondem melhor à dietas low carb para perda de peso, enquanto indivíduos mais sensíveis à insulina respondem melhor à dietas com maior conteúdo de carboidratos [6]. Outros estudos têm mostrado também que gorduras poli e monoinsaturadas podem ter um papel benéfico na expressão gênica, enquanto a ingestão aumentada de ácidos graxos saturados um papel desfavorável no perfil de genes envolvidos no processo inflamatório [5] (penso que a composição de carboidratos pode ser relevante nesse caso).



Muitas pessoas podem achar que se elas têm dificuldade para perda de peso através da dieta e da atividade física, o uso de hormônios e outros fármacos seria uma solução. O problema é que muitos poliformismos de genes associados à perda de peso/gordura implicam em respostas diferenciadas desses receptores (sensibilidade ao ligante/hormônio), de forma que a resposta do corpo não será a mesma de um indivíduo sem as mesmas variantes genéticas. É preciso ter em conta que algumas pessoas simplesmente nasceram para serem mais magras e secas que outras (diferentes “set point”), enquanto outros nasceram com mais facilidade para ganhar músculos, e embora você possa alterar isso pela influência dos fatores ambientais na expressão gênica, o perfil genético estabelece um limite para o potencial de cada um. Longe de ser apenas um texto pessimista sobre suas limitações genéticas em relação à sua composição corporal, estou aqui para dizer que as estratégias adotadas em relação ao treinamento, dieta e uso de fármacos, deve ser pensada de forma individual, pois isso sim fará diferença na forma que seu corpo vai responder a essas estratégias. Seria mais fácil se você conhecesse seu perfil genético através de exames genéticos, mas por enquanto é uma realidade para poucos.

abraços, Dudu Haluch

REFERÊNCIAS:

[1] Tratado de Endocrinologia Clínica Wajchenberg.
Wajchenberg, Lerario e Betti.

[2] Overfeeding and metabolic advantage
by Michael Eades

[3] VANTAGEM METABÓLICA DE DIETAS LOW CARB E CICLO DE CARBOIDRATOS (DUDU)
Thermodynamics and Metabolic Advantage of Weight Loss Diets.
Feinman RD, Fine EJ
“A calorie is a calorie” violates the second law of thermodynamics
Richard D Feinman and Eugene J Fine

[4] Nutrição e Metabolismo, Ma nual de Procedimentos em Nutrologia.
Machado, Silvestre e Marchini.

[5] Nutrigenética e Implicações na Saúde Humana.
Dal Bosco & Genro.
Interação entre gene e nutriente e sua associação à obesidade e ao diabetes melito
Thais Steemburgo; Mirela J. de Azevedo; José Alfredo Martínez



[6] Insulin sensitivity determines the effectiveness of dietary macronutrient composition on weight loss in obese women.
Cornier MA, Donahoo WT, Pereira R, Gurevich I, Westergren R, Enerback S, Eckel PJ, Goalstone ML, Hill JO, Eckel RH, Draznin B.




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